As rupturas hidráulicas constituem fenômenos críticos na engenharia hidráulica e geotécnica, caracterizando-se pela perda de resistência e estabilidade de estruturas ou massas de solo devido à ação das forças de percolação da água. Este processo representa uma das principais causas de falhas em obras hidráulicas, especialmente em barragens, onde pode resultar em consequências catastróficas para a população e o meio ambiente12.
A ruptura hidráulica é definida como o processo de perda da resistência ou da estabilidade de uma massa de solo por efeito das forças de percolação2. Este fenômeno ocorre quando a água possui energia suficiente para que, ao percolar, consiga desestruturar ou desestabilizar o solo. O conceito pode ser entendido como a perda de resistência e estabilidade do solo, com a consequente desestruturação do maciço ou da edificação construída sobre esse solo, por efeito de percolação da água.
O mecanismo básico envolve a força de percolação, que é necessária para vencer o atrito viscoso desenvolvido entre a água e as partículas sólidas. Esta força é proporcional à diferença de carga hidráulica e ao volume de solo considerado. Na condição crítica, o solo pode romper, produzindo dois tipos de acontecimentos principais: areia movediça (liquefação) quando a força de percolação neutraliza completamente o peso submerso, e erosão regressiva (piping) quando as partículas de solo são arrastadas pela força de percolação2.
O galgamento representa o tipo de ruptura mais comum em barragens e ocorre quando a água transpassa o coroamento da barragem34. Este fenômeno pode ser causado principalmente por três fatores: má operação do reservatório durante um evento de cheia, passagem de um evento de cheia extraordinária que supera a capacidade de projeto, ou formação de uma onda no reservatório de origem sísmica ou de grande deslizamento de terra nas encostas5.

Esquema ilustrando ruptura de barragem por galgamento
O processo de galgamento inicia-se quando o nível de água gerado supera a crista da barragem, resultando em escoamento sobre a face de jusante do maciço. Este escoamento é capaz de mobilizar as partículas de solo, gerando erosão e, por fim, a ruptura4. A água que passa por cima da crista desce o talude, ganha velocidade e pode gerar problemas tanto de erosão da face de jusante quanto de pressão de água além do dimensionado.
O fenômeno de galgamento pode acarretar deslizamentos em barragens de gravidade e destruição parcial ou total no caso de barragens de terra ou de enrocamento, sendo estas mais suscetíveis devido à presença de material constituinte solto5. O rompimento por galgamento devido à falta de capacidade do vertedouro de extravasar a água ocorre quando as cheias afluem no reservatório da barragem e ultrapassam o nível para os quais a estrutura foi projetada.
A erosão interna, conhecida como piping, representa uma das principais causas de ruptura em barragens, sendo responsável por 80% das rupturas em barragens de terra segundo alguns estudos62. Este fenômeno é caracterizado como uma forma de ruptura hidráulica com erosão interna e progressão contrária ao fluxo de água, denominada retroerosão tubular7.

Diagrama do fenômeno de piping (erosão interna) em barragem
O piping ocorre nas regiões onde o gradiente hidráulico alcança valores elevados, provocando o arraste das partículas de solo de forma contínua e progressiva, resultando no rompimento da estrutura6. O pé de jusante é o local mais crítico para a formação do piping, pois nesta região os gradientes hidráulicos são elevados e os níveis de tensão confinante são baixos.
O desenvolvimento do piping é tradicionalmente dividido em quatro etapas: Iniciação, Continuação, Progressão e Ruptura6. A etapa de "Iniciação" é caracterizada pela existência de anomalias ou condições que facilitem o processo de erosão ocorrer, não necessariamente sendo uma anomalia evidente, bastando haver material susceptível à erosão ou região de contato entre materiais diferentes. A etapa "Continuação" determinará se o tubo continuará se formando no maciço compactado e do filtro da barragem. A etapa de "Progressão" evolui em direção a montante completando o tubo, e o tempo entre a completa formação do tubo e a ruptura da barragem pode ocorrer em horas7.
A liquefação constitui um fenômeno em que um material rígido passa a se comportar como fluido, ocorrendo quando o fluxo de água presente nesse material exerce uma força que anula o peso e a aderência de suas partículas, fazendo com que elas fiquem soltas8. Este processo ocorre naturalmente no meio ambiente nas areias movediças, e em barragens pode ser provocado por excesso de chuvas, excesso de carga depositada rapidamente, abalos sísmicos ou problemas no sistema de drenagem.
